Um jovem brasileiro ligado ao Estado Islâmico usou grupos na internet para recrutar quatro adolescentes de cidades do interior do Rio de Janeiro e de São Paulo entre os anos 2022 e 2023. Pelo menos dois menores de 18 anos já estavam em avançado estágio de radicalização.
Conhecido nas redes pelo codinome Mahmoud al-Brazili, o morador de Barbacena, identificado como Oliveira, hoje com 20 anos, foi preso, em junho do ano passado, quando tentava chegar à África, onde se juntaria aos terroristas. Ele foi condenado a 7 anos de prisão por terrorismo e corrupção de menores em maio deste ano. A defesa alega que ele tem deficiência mental e vai entrar com um pedido de revisão criminal.
A prisão de Oliveira chegou a ser divulgada na imprensa no ano passado, mas agora o Portal Metrópoles teve acesso a documentos inéditos da investigação da Polícia Federal (PF) que revelam detalhes de como o grupo terrorista tentava cooptar jovens e adolescentes do Brasil.
De acordo com a Policia Federal, o primeiro alerta sobre a pequena célula do ISIS (sigla em inglês para Estado Islâmico) no Brasil em 2022, foi feita pelo serviço de inteligência de Marrocos. A embaixada do Brasil no Marrocos foi informada de que foi interceptada uma conversa de Mahmoud al-Brazili sobre um possível atentado em uma Igreja Católica de Barbacena (MG). Oliveira morava na cidade com a avó. Essa denúncia foi repassada para a Divisão de Enfrentamento ao Terrorismo da PF no mesmo dia.
FBI
A situação ficou ainda mais urgente depois que o FBI, a polícia federal do Estados Unidos, entrou em contato com os investigadores brasileiros. Um vídeo no serviço de armazenamento criptografado mostrava ele de capuz e rosto coberto, respondendo a uma espécie de questionário do grupo terrorista.
Conversas pelo Telegram mostram a rotina de doutrinação e radicalização a que eram submetidos os adolescentes. Oliveira selecionou os adolescentes em grupos mais amplos de estudo do alcorão e convidou eles para um mais reservado.
O termo “salafis” usado pelo adolescente se refere aos adeptos do salafismo, um movimento ultraconservador dentro do islamismo sunita.
Alguns dias depois de receber a ideia de um atentado contra o consulado, ele enviou um documento com instruções de fabricação de bombas para esse adolescente. O jovem e o adolescente manifestaram no Telegram sobre o interesse em se juntar ao ISIS em Moçambique.
De acordo com a investigação da PF, Oliveira orientou dois adolescentes, de codinomes Hassan e Shams, para cometer um ataque terrorista contra uma representação dos Estados Unidos no Brasil, caso ele fosse barrado na imigração ou preso, quando tentasse sair do país para se juntar ao ISIS.
No momento em que foi preso no Aeroporto de Guarulhos, em 11 de junho do ano passado, ele pediu para fazer uma ligação e entrou em contato com um desses adolescentes. A PF acredita que a ideia era colocar o plano em prática.
EX-COROINHA
Oliveira foi condenado na Justiça Federal e não houve tentativa de recurso. Ele era assistido pela Defensoria Pública da União. No entanto, um novo advogado da família pretende entrar com um pedido de revisão criminal por considerar que ele possivelmente tem algum tipo de espectro autista, na expectativa de que seja considerado semi-imputável. Na cidade de Barbacena, o jovem era visto apenas como uma pessoa “estranha”.
O advogado Greg Andrade descreve ele como alguém que era muito ativo na Igreja Católica, ao ponto de ser coroinha. Ele se converteu ao islamismo quando começou a trabalhar em serviços gerais num curtume de abate halal, que é um tipo de preparo de produtos de origem animal para exportação ao mercado muçulmano.
A PF suspeita que ele foi cooptado e radicalizado dentro da religião pelos irmãos brasileiros Thaylan e Thauann Palomanes, presos em Málaga, na Espanha, em novembro do ano passado, por envolvimento com o Estado Islâmico.
Para Greg, Oliveira é uma pessoa com hiperfoco e muito inteligente, mas sem apoio necessário do Estado. De fato, os investigadores da PF ficaram impressionados com a facilidade do jovem em falar inglês e árabe.
“O sonho dele é fazer medicina. Os integrantes do Estado Islâmico entraram na mente dele e falaram que lá ele teria condições de estudar e ter várias esposas. Ele ficou muito envolvido, se sentindo muito importante. Talvez foi a única vez na vida que ele se sentiu importante. Nós não damos valor à nossa juventude, mas o terrorismo deu”, avalia o advogado.
A avó de Oliveira, de 61 anos, considera que a condenação e prisão do neto foi injusta e entende que ele foi vítima por ter sido cooptado pelo grupo terrorista. “Tem que sempre verificar o que os filhos fazem e aconselhar, porque, por mais que a pessoa seja boa, sempre tem predadores nas redes sociais.”
Matéria do Portal Metrópoles