O pó que sobe durante as obras de descaracterização de uma enorme barragem de rejeitos de minério — e de cada um dos caminhões que transitam pela cidade ao longo da obra — tem um impacto claro na vida dos moradores de Antônio Pereira, distrito de Ouro Preto, na região Central de Minas: o aumento em problemas de saúde e, consequentemente, também dos gastos com medicamentos e outros produtos para amenizar os impactos na vida de idosos, adultos, crianças e, até mesmo, animais de estimação. A realidade, denunciada por uma moradora da pequena comunidade ouro-pretana, é corroborada por um relatório produzido pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-MG), que apontou para um gasto 40% maior com saúde nas cidades com mais extração de minério de ferro em Minas Gerais.
Com objetivo de entender se o recebimento de recursos da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM) melhorou a qualidade da vida da população que convive com a atividade, o relatório “Saúde pública e mineração de ferro: uma análise comparativa no Estado de Minas Gerais” comparou dados dos 20 municípios mineiros que mais receberam os repasses com outras 328 cidades sem nenhuma atividade mineradora.
Os 20 municípios analisados no estudo foram selecionados por serem aqueles que, juntos, receberam 98,57% dos recursos do CFEM, sendo eles: Antônio Dias, Barão de Cocais, Bela Vista de Minas, Belo Vale, Brumadinho, Catas Altas, Conceição do Mato Dentro, Congonhas, Igarapé, Itabira, Itabirito, Itatiaiuçu, Mariana, Mateus Leme, Nova Lima, Ouro Preto, Rio Acima, Santa Bárbara, São Gonçalo do Rio Abaixo e Sarzedo.
Juntas, essas duas dezenas de cidades totalizaram uma receita de R$ 295,5 milhões em 2024. O valor representa sete vezes mais que a verba dos mais de 300 municípios do grupo de controle, que somaram R$ 40 milhões de recursos no mesmo ano. O levantamento constatou ainda que os moradores das cidades mineradoras também apresentaram uma receita per capita quase duas vezes maior (R$ 12 mil contra R$ 6,9 mil nas demais), o que, para o TCE-MG, indica que estas cidades são “economicamente mais favorecidas”.
Porém, a “bonança” dessas cidades não se reflete no bem-estar de seus moradores, que precisam gastar mais para manter a população saudável. O Tribunal se deparou com dados que mostram um maior gasto com a saúde de habitantes das cidades mineradoras em comparação com o valor despendido em municípios onde não há a atividade. Casos de doenças do sistema respiratório, dos olhos e ouvidos são as mais recorrentes.
Conforme o documento, o gasto médio per capita com saúde nestas 20 cidades foi de R$ 3,5 mil, enquanto, nas cidades sem mineração, a quantia gasta foi de R$ 2,5 mil, uma diferença de 37,7%. A discrepância também é clara nos gastos com internações por problemas respiratórios destes municípios, que foi de R$ 1,2 mil contra R$ 886 naqueles que não receberam nenhum valor do CFEM, uma disparidade de 35,7%.
Essa elevação ocorre de forma ainda mais drástica (70%) nas internações por doenças do olho, ouvido e na chamada apófise mastoide. Nesta categoria, as cidades com mineração tiveram um gasto médio de R$ 1,5 mil contra cerca de R$ 900 nos outros municípios de controle.
O Tempo