O art. 37, II, da Constituição Federal de 1988, determina que a investidura em cargo ou emprego público somente se dará por meio de concurso público de provas e títulos. Referido mandamento quer possibilitar que todos tenham oportunidade de ocupar cargos públicos pela sua competência, independentemente de filiação partidária ou “apadrinhamento”, como por séculos aconteceu em nosso país. Desde os tempos de colônia que o Brasil utiliza do apadrinhamento para conceder benefícios aos “amigos do rei”. Muito comum era que os portugueses que chegavam ao Brasil “ganhassem” um cargo público para que a Coroa pudesse os manter. A “doação” de cartórios era mais do que comum, cirando a “jabuticaba” de um serviço essencialmente público (registro) pertencer a particulares. Pelo menos hoje, para ser tabelião de cartório existe um concurso público.
Quando analisamos a situação do funcionalismo público da União e Estados, vemos que há cumprimento quase total do preceito constitucional, existindo concursos públicos rotineiros para provimento de cargos vagos. Mas em municípios, principalmente os de pequeno porte, as coisas não são bem assim. E nossa cidade, é uma clara demonstração do descumprimento do preceito constitucional. A cada mudança de governo em nossa cidade, dividida em “dois lados” políticos, há uma revoada de pessoas saindo e entrando no serviço público. E não se está falando aqui de cargos comissionados, mas de cargos e empregos formais , o que, deveras, prejudica em muito o serviço público. Na última legislatura, tivemos uma mudança na lei para que os Diretores de Escolas municipais pudessem ser escolhidas pelo Executivo independente da vontade da comunidade escolar de serem concursadas e lotadas naquela escola, em clara demonstração de “apadrinhamento” na forma de contratação, e não de competência. Como se não bastasse, no “apagar das luzes” da última legislatura, foi enviado pelo então Prefeito Reinaldo, salvo melhor juízo, a pedido do atual Prefeito Anderson, uma lei para modificação da estrutura e organização de cargos da Prefeitura Municipal, com criação de dezenas (ou será centenas?) de cargos de chefia e TODOS sem concurso ou sem necessidade de seus ocupantes serem funcionários públicos concursados.
Não estamos aqui a dizer que não se pode existir cargos em comissão. Os cargos de confiança são fundamentais para a estruturação de qualquer governo. Mas existir tantos cargos de confiança em um município de pouco mais 20 mil habitantes, soa-nos um pouco estranho. Além de ser uma determinação constitucional, o Concurso Público resolveria grandes problemas do gestor municipal, pois não precisaria “dar satisfação aos seus partidários do porquê de não tê-los contratado para trabalhar na Prefeitura”. Bastava dizer: “a culpa não é minha. A lei é que determina que só posso contratar com concurso púbico”. Mas, infelizmente, não é isso que acontece. Aparentemente, os gestores municipais preferem ter essa “carta na manga”, em um verdadeiro “toma lá dá cá”, algumas vezes trocando votos por empregos, como foi tão comum no século passado. O concurso público para o provimento de cargos é fundamental na democracia. Não importa o partidarismo. O funcionário público é empregado do Município, e não do Prefeito.
Deve servir ao povo, e não ao administrador. Então, não importa quem é o gestor municipal para o funcionário público. Deve ele cumprir sua função, sob pena de demissão após processo administrativo. E o concurso público possibilitará que os melhores exerçam essa função. Não por ser amigo ou partidário de alguém, mas por ser competente. Há uma história folclórica na vizinha cidade de Dores de Campos que um ex-prefeito, em conversa com um Promotor de Justiça que exigia a realização de um concurso público, teria dito que não fazia o concurso porque seus partidários eram “burros” e não passariam, e ele precisava garantir o “emprego de seus amigos”… Este mesmo Promotor confidenciou-me que essa conversa nunca existiu. Mas serve bem para ilustrar nossa opinião. Não cabe ao gestor usar a máquina pública para garantir benefícios aos seus apadrinhados. Cabe a ele garantir o bom funcionamento da administração pública, com funcionários públicos competentes e comprometidos, independente de seu pensamento político partidário.
Tomara que, ainda nesta legislatura, possam, Prefeito e Vereadores, entender a importância da organização do serviço público, buscando os cargos vagos e abrindo concurso público de ampla concorrência, pensando no bem do município e não em suas carreiras políticas e a pavorosa reeleição.
por Gian Brandão