Os casos confirmados de coronavírus já chegaram a 96% das cidades de Minas. Com relação às mortes, Minas ultrapassou nesta quarta-feira (12) a metade dos municípios com registros de óbitos pela doença. Os dados são da Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG). De acordo com o boletim epidemiológico divulgado hoje, 428 municípios já tiveram notificação de vidas perdidas pela pandemia.
Em todo o estado, a letalidade da doença aumenta juntamente aos desafios dos leitos, o desrespeito às medidas de isolamento social e à pouca testagem. É o que avalia o professor da Escola de Farmácia da Universidade Federal de Ouro Preto, Alexandre Barbosa Reis.
Segundo ele, a primeira questão é que a doença tem comportamentos epidemiológicos no Brasil e em Minas de formas diferentes. “Ela não se espalha de forma uniforme. Temos os epicentros da doença. E dependendo das medidas que são tomadas, essa doença se espalha mais ou menos”, explica Reis. “Temos um aspecto importante das próprias decisões em termos de saúde pública que obviamente interfere na questão do espalhamento do vírus”, analisa.
O especialista avalia que, em termos de políticas públicas, Minas conseguiu medidas que influenciaram de forma positiva no controle do coronavírus no início da pandemia, mas, com o relaxamento da população quanto às medidas sanitárias, os casos interiorizaram. E o problema da interiorização é que muitos municípios não têm estrutura de atendimento aos pacientes graves, o que acarreta o aumento das mortes.
“Como em qualquer outro estado, os hospitais são melhores e de forma mais estruturada na capital. Mais do que isso, temos uma questão de equipes de saúde muito bem treinadas, concentradas em Belo Horizonte e outras macrorregiões”, explica. “As pessoas estão morrendo na estrada. Minas Gerais é um estado muito grande, cujos deslocamentos distantes da capital ou a outros atendimentos de alta complexidade podem ser de até 1 mil quilômetros.”
Outros agravantes
O aumento das viagens de pessoas do interior para a capital e vice-versa também contribuíram para essa expansão da doença. “As atividades foram retomadas em muitos lugares. E, embora o tráfego de carros tenha diminuído no início da pandemia, depois isso foi aumentando”, disse Reis.
Segundo o professor, o contexto político do país também prejudica o combate à COVID-19. “Perdemos o Ministério de Saúde no sentido de perder a obrigatoriedade de coordenar as ações junto aos estados e municípios por uma interrupção política. Tudo isso agravou a situação”, problematiza. “E você considerar um estado com 853 municípios em que apenas 33 o vírus ainda não chegou. É muito pouco. Minas está em um momento muito delicado, batendo recordes de mortes dia após dia. O vírus encontrou uma outra realidade de estrutura de aparelhos de saúde nos municípios que no máximo tem um posto de programa de saúde da família, sem equipamentos ou muito precários.”
Falta testagem
O professor acredita que a falta de testagem nos municípios influenciou diretamente na ausência de políticas públicas para interromper o processo de interiorização da COVID-19. “Num primeiro momento teve um controle muito grande, mas depois de um determinado tempo começa a observar a interiorização que poderia ter sido evitada com medidas públicas. Estamos enfrentando problemas com testagem, por exemplo”, exemplifica.
Reis participou de um estudo em Nepomuceno, no Sul de Minas, e Carmópolis de Minas, no Centro-Oeste, que tinha o objetivo de verificar a taxa de indivíduos com sorologia positiva para o Sars-Cov-2. Elas foram escolhidas por fazerem parte da rota entre Belo Horizonte e São Paulo e terem forte atividade de logística. Quando os pesquisadores foram às cidades para realizar a testagem, não tinham nenhum caso, e, logo depois detectaram a doença. “A maioria dos casos relacionados à logística, como motoristas de caminhão e seus familiares”, conta.
Para o professor, isso indica que, a princípio, o processo de interiorização teve uma forte participação do setor de logística e rodoviário. “Isso poderia ter sido evitado porque já era indicado por profissionais de saúde, tanto como pesquisadores, o isolamento. O sistema não foi monitorado para isolar os positivos. Primeiro precisávamos diagnosticar, depois isolar o infectado e, após isso, rastrear os contactantes daquela pessoa”, recomenda. “ A gente sabe que não tem como fechar as rodovias, mas o serviço deve ser mantido com todos os cuidados, o que não houve.”
Informações Hoje em Dia